Everything, um poema de amor de A. R. Ammons

ammons

Encontrei numa promoção qualquer de 30% sobre os preços dos importados da Livraria da Vila uma edição-compêndio que me pareceu incrível (e é!) da Picador com toda e qualquer coisa boa em termos de ensaio, ficção, poesia, entrevistas e etcéteras da Paris Review desde 1953. Ezra Pound, Primo Levi, Jonathan Franzen, Kerouac, Mario Vargas Llosa, Susan Sontag e mais umas dezenas de ótimos nomes. E por falar em nome, antes mesmo de espiar o sumário, que cristão não levaria para casa um livro chamado The Paris Review book of heartbreak, madness, sex, love, betrayal, outsiders, intoxication, war, whimsy, horrors, God, death, dinner, baseball, travels, the art of writing, and everything else in the world since 1953? Se tudo o que importa na vida, ou melhor, se tudo de que a vida é feita está num único livro – que não é a Bíblia – e os apóstolos são gente como Naipaul, García Marquez, Tennesse Williams, Alice Munro, Truman Capote e Gertrude Stein (Philip Roth não conta, minha implicância com este senhor o coloca na qualidade de um Judas, no máximo), porque não gastar uns trocados, é ou não é?

Isso já faz uns quatro meses, lembro apenas que as árvores de Natal já invadiam todos os cantos do shopping Higienópolis, e eu ainda não tive tempo para ler essa maravilha em papel jornal. Acontece que no mesmo dia, antes do ensaio da roda de choro (digamos que eu toco pandeiro em uma), enquanto tomava minha sagrada 8.6 com pizza de muçarela, aquelas de balcão, a esmo abri em Love. Amor. Então eu descobri num poema de Archie Randolph Ammons (1926 – 2001 / Whiteville, Carolina do Norte) meia dúzia de palavras tão perfeitas, que juntas eram basicamente tudo o que a gente quer dizer e quer expressar e não consegue quando alguém chega de repente na nossa vida e as coisas começam a fazer sentido. Até o ar. Até as cadeiras. Ou ganha um sentido que se sentia perdido mas que a gente nem sabia que pudesse existir. Ali, cortando a pizza, meus olhos se encheram de cisquinhos invisíveis.

Posto aqui o bendito poema no original em inglês, mas aceito ajuda com uma meticulosa e respeitosa tradução de Everything, pois não tenho notícia de que exista uma e não gostaria que uma vírgula do sentido inicial se perdesse.

Everything

found on the back of an envelope from Helen Vendler, 1.28.1981

You came one day and
as usual in such matters
significance filled everything –
your eyes, the things you
knew, the way you turned,
leaned, stood, or sat
this way or that: when
you left, the area around here rose
a tilted tide, and everything that
offers desolation drained away.

– A.R. Ammons